MEDO: a cabeça pira!
Marina da Silva
Há alguns anos, quando surgiram os blogs e passei a publicar sobre o perrengue que me abateu literalmente, jogou-me na lona, eu sempre busco falar da importância de não se deixar dominar pelo medo. Claro que o medo faz parte da vida e nos perrengues da vida, não só de doenças, qualquer coisa grave, o medão vem no pacote!
Eu não consegui lidar com o medo de morrer nem antes nem muito tempo depois, eu aprendi a viver com o medo com ajuda do tratamento psicológico e com os medicamentos tarjas-pretas. E estes não foram as únicas armas das quais lancei mão, mas foram e são de excelente ajuda, afinal não morri nem do câncer nem do medo.
Ás vezes me pego pensando por que ninguém há quinze anos atrás [meu caso] e mesmo no século passado e quiçá atualmente, se deu conta que a "cabeça" faz parte do corpo a ser tratado! Por cabeça entenda todos os sentimentos confusos, conflitantes, tenebrosos, medos, enfim, tudo que assola a cabeça da pessoa diante de um diagnóstico de câncer!
Parece que o tumor assume a identidade da gente e só se pensa e fala e trata o danado. O que está absolutamente correto, mas e o resto? Não sei com você, mas eu tive que pensar em tudo e todos: como contar para a família, como esconder para poupar a família, como contar para uma criança de sete aninhos sobre o perrengue, como a escola poderia ajudar, como voltar a estudar, trabalhar e acredite, até como seria a vida se eu não saísse viva para minha filha e ex-marido nas três décadas a partir de...Afff
Passei por todas as fases: o sustão, a queda, a negação, a blindagem da cabeça para seguir fingindo que era Mulher Maravilha, reunindo forças, montando um exército para não deixar a peteca cair; a virada Muié Marmota indo ao fundo do poço e aceitando o mais incrível: eu não era/sou a rainha da cocada baiana com pimenta!
Eu me perdi no diagnóstico e tive que vir catando os cacos e me reconstruindo aos poucos e me sentindo Frankenstein e com raiva e ódio profundos de tudo, Deus incluso. Queria minha vida de volta! Pronto, falei!
Em 2001 havia celulares, internet, redes sociais como Orkut, mas eu lidava muito pouco com as novas tecnologias. Era tudo muito novo, obscuro e havia a pregação do "mal da internet" desde os anos noventa! A moda eram os celulares e computadores pessoais e games.
O jeito que achei de enfrentar o medo da doença voltar foi ocupar minha cabeça 24H por dia, todos os dias do ano. Trabalho, muita faxina, estudos. Fiz duas especializações! kkkkkk
A escrita foi minha terapia e escrever um diário foi o melhor conselho que recebi, embora tenha zombado dele no início! Eu passei a prescrever a "escritaterapia" todas as vezes que tive chance pessoalmente e depois no blog e Twitter e Facebook e "zapis"!
Foi a forma ideal para mim, foi como combati o espalhamento de ideias malucas para a cabeça e lidei com o medo na fase terror!
E esta primeira escrita não ajustou os parafusos da minha cabeça, mas me deixou mais funcional, abusando da linguagem século XXI! A psicanálise, terapia da palavra, esta me ajudou muito e ajuda. Sempre que o "bicho pega" peço ajuda, socorro, salvação, dependendo do tamanho da "coisa".
Tem a Fé, mas esta vem em primeiro lugar de tudo! É dela que tirei forças para seguir o tratamento e me quitar fora da cabeça os pensamentos mórbidos e ideias malucas que chamo de metástases psicológicas.
Mas sempre fiquei com um "trem" mal ajambrado, inacabado, inadequado, indesejável na cabeça: por que ninguém pensava na minha cabeça?
Claro que pensavam tanto os médicos como familiares e amigos e colegas e vizinhos e até o síndico. rsrsrs
Livros, orações, presentes, visitas, conselhos! O medo do câncer impediu alguns de se aproximar e afastou alguns outros, entendi depois como parte da vida! Das curiosidades que me abalaram: uma era ter que fazer sexo para o homem não me abandonar! Gzuis! kkkkk Eu devia estar sempre bem, linda, recatada, dular? TNC! Fingi muito que tudo estava bem quando na verdade queria mesmo era ter tido coragem pra chutar o balde, soltar os cachorros, mandar para os quintos dusinfernú!
Até a minha "preciosa" vinha em primeiro lugar e não era para mim, para o meu prazer e minha alegria e sim para "nossa alegria"?kkkkkkk
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Há algum tempo, e, infelizmente não sei precisar desde quando, notei a ausência do medo na minha pessoa e um desaceleramento geral. Quando isto aconteceu eu não sei, mas sei que é possível e talvez se eu tivesse as ferramentas corretas poderia ter lidado melhor com "minha cabeça" que ficou despregada do corpo, sabotada por mim, mas também por outros!
Conversando comigo mesma eu sempre me dizia:
_Você não precisa de ninguém pra te ferrar!
E eu mesma tinha que lidar comigo para não sabotar a minha própria pessoa! Soou esquisito néh? Nem sei se consigo repetir o que escrevi acima, mas tem isto mesmo comigo!
Escrever em blog foi outra ferramenta que me ajudou mais que eu possa ter ajudado outra pessoa, admito com orgulho e pesar: por que não haviam inventado os blogs, Twitter, Facebook, What'sapp lá nos idos do perrengue? Eu teria salvado a "minha cabeça" da minha cabeça! kkkkk
CONSELHO: use e abuse das redes sociais, dos grupos de apoio virtuais CONFIÁVEIS! Achar alguém que viveu ou está vivendo o mesmo que nós e uma, duas, várias vezes e poder trocar ideias e sentimentos é muito bom, aliás, excelente para a cabeça. Descobrir que não está sozinho(a), que não é um(a) alienígena, que não está falando grego ou mandarim ao expor suas dúvidas, medos, angústias e questões que parecem bobinhas [ficar careca], mas são de transcendental importância para a gente SALVARÁ a sua cabeça! Bj e pandiquejú. Marina